Uma sociedade que realmente quer evoluir na relação com o dinheiro precisa, desde cedo, ensinar as crianças sobre educação financeira.
Embora não seja um tema ainda explorado no ensino fundamental e médio, a educação financeira tem sido cada vez mais buscada pelas pessoas que querem dar uma reviravolta positiva em suas finanças.
E, quanto mais cedo se aprende e põe seus ensinamentos em prática, maiores são as chances de a criança ter uma vida próspera quando crescer. E, claro, não podemos nos esquecer que, ao ensinar, também estamos aprendendo. Veja isso como uma boa oportunidade até mesmo para colocar em prática alguns dos ensinamentos básicos, liderando pelo exemplo e, claro, cuidando da boa saúde das suas finanças pessoais nesse processo.
Uma pesquisa feita pela Serasa, chamada “Finanças Infantis”, detectou que 85% dos pais ensinam em casa a importância de se ter uma vida saudável. O acesso à informação facilita bastante esse método de aprendizagem: algumas ferramentas, como canais de finanças pessoais do YouTube ou até mesmo a leitura de alguns e-books sobre finanças pessoais são de grande ajuda - e temos artigos no blog da Embracon que ajudam nessa trilha, como os melhores livros sobre o assunto e o guia definitivo para começar a poupar.
A partir de 2022, o tema educação financeira será obrigatório na grade curricular das escolas. Porém, até que os resultados dessa aprendizagem sejam vistos, pode levar um bom tempo.
Países que investem em educação financeira veem as pessoas em fase adulta contraindo menos dívida e tendo uma melhor relação com o dinheiro. Infelizmente, essa não é a realidade do Brasil. Antes mesmo da pandemia de Covid-19, o país já tinha um alto número de endividados, que passava dos 65%. Esse percentual tem aumentado significativamente nos últimos meses, diante de dificuldades como o fechamento do comércio e do isolamento social.
Esse contexto todo é importante e só ressalta a importância de se ensinar às crianças como guardar dinheiro. É um exercício que deve ser acompanhado, para que ela realmente entenda o valor do dinheiro e, no futuro, contribua para mudar a estatística de um país que ainda tem muitos desafios pela frente quando o assunto é educação financeira.
Para ajudar nessa jornada, confira nossas dicas de como ensinar as crianças a guardar dinheiro.
Explicar sobre a importância do dinheiro
O primeiro passo é explicar para a criança a importância que o dinheiro tem em nossas vidas. Somente quando damos a dimensão de quanto custa um determinado brinquedo ou até mesmo algo que a criança consome rotineiramente, ela começa a entender o real valor da moeda.
Vamos utilizar um exemplo: digamos que a criança peça que você compre um presente para ela. Quando você sempre dá o presente pedido, a criança fica com a impressão de que a única coisa que afasta o desejo dela do presente é a ação do pai ou da mãe. Algo está faltando aí no meio: para a compra, é preciso ter dinheiro, e se você não deixa isso claro, bom, ela vai pensar que sempre que pedir, somente a boa vontade de dar seria o suficiente.
Por isso, pegue este exemplo como uma oportunidade de ensinar sobre educação financeira: sempre que a criança pedir para comprar um brinquedo, mostre que existe um valor para a compra e, para isso, é necessário uma quantia de dinheiro. Claro que se a criança ainda não souber contar, precisa seguir alguns passos para ter dimensão dos valores. Mas, quanto antes você instituir esse questionamento no dia a dia, mais fluido será o processo de aprendizagem.
Dê bons exemplos
Para que a criança comece a entender como funciona o dinheiro na prática, você precisa dar exemplos práticos para a criança. Atividades rotineiras podem ajudar nesse sentido. Pegue um exemplo simples, como ir na padaria para comprar o café da manhã: realize a compra explicando o valor que você deu como dinheiro e como funciona a lógica do troco.
Ter dinheiro em espécie nesse momento é fundamental, porque mostra que existe um valor cobrado e existe a dinâmica do troco. Embora o uso do cartão de débito ou de crédito seja cada vez mais comum na vida do brasileiro, o uso do dinheiro em espécie tangibiliza melhor para a criança a forma com que lidamos com o que temos à disposição.
O uso do cartão dá a impressão de que é muito fácil lidar com qualquer tipo de pagamento. Já com o dinheiro em espécie, fica mais fácil para a criança visualizar como realmente funciona na prática a compra de um item.
Nos ensinamentos práticos, você pode até mesmo colocar a criança em uma situação em que ela precisa comprar alguma coisa. Você pode fazer pequenos exercícios: por exemplo, com um valor de R$20, o que ela poderia comprar dentro de um determinado estabelecimento?
Aos poucos, ela vai aprendendo o valor do dinheiro e a tomar melhores decisões de compra no dia a dia. Claro que, para isso, persistência e muita paciência são mais que necessários.
Considere dar uma mesada
A melhor forma de fazer com que a criança melhore a sua relação com o dinheiro é com uma mesada. Com um valor fixado mensalmente, ela pode decidir na prática como usar o dinheiro da melhor forma e, com isso, aprender o valor inerente a ele.
Antes de dar uma mesada, explique o por que você está dando o valor e transfira a responsabilidade para a criança, para que possa cuidar do dinheiro que recebe e pagar por aquilo que gostaria de ter ou tem vontade de fazer.
Para crianças menores, você pode até mesmo considerar uma semanada. Um estudo da Universidade do Estado de Ohio, nos Estados Unidos, sugeriu que crianças entre 4 e 5 anos ainda não retêm a informação no exato momento em que aprendem alguma coisa. Por isso, é preciso repetir os ensinamentos com mais persistência, para que elas absorvam melhor o aprendizado. Para essas crianças, o valor de uma semanada pode funcionar melhor.
O grande ensinamento por trás de uma mesada ou semanada é deixar claro que o dinheiro não é infinito. No começo, as crianças podem tomar algumas decisões frustrantes, como gastar tudo em uma ida à doceria, por exemplo. Mas, aos poucos, elas vão aprendendo que precisam pensar bem antes de seguir com qualquer decisão.
É importante que elas saibam que só podem contar com o valor novamente no mês seguinte, para que comecem a ter noção do verdadeiro valor do dinheiro. Dessa forma, elas aprendem na prática a importância de ter um valor mais elevado para a compra de um bem maior - como um videogame, por exemplo. E, assim, compreendem a importância de guardar dinheiro para a conquista de objetivos que consideram relevantes nessa etapa da vida.
Ajude a criança a ter metas
Dar mesada é importante, mas o erro é achar que essa medida é o suficiente para que a criança passe a fazer boas escolhas com o dinheiro.
A melhor forma de fazer com que a criança entenda a importância do planejamento é estipulando metas em conjunto. Leve em consideração alguns desejos que ela tem. Por exemplo, se ela quer o videogame de última geração ou gostaria de ter um laptop mais potente, orientá-la a juntar o dinheiro para essa finalidade pode ser uma boa diretriz.
Antes mesmo de estipular as metas, é importante que a criança entenda qual a melhor decisão a ser tomada. Por exemplo, ao se programar para a compra de um novo laptop, é preciso que fique claro que o videogame ficará em segundo plano, visto que a mesada não é o suficiente para a compra rápida desses dois itens.
Ao dar a responsabilidade de estabelecer uma meta, a criança começa a pesar algumas escolhas e tende a valorizar mais a relação que se tem com o dinheiro, para que consiga atingir o que realmente deseja.
Claro que, dependendo do bem que ela selecionar, seriam necessários muitos meses ou longos anos sem ter nenhum tipo de gasto para que ela consiga o que quer. O mais importante nesta etapa é que a criança participe do processo de compra do que realmente deseja, por mais simbólico que seja o valor.
Assim, quando as metas forem atingidas, elas acabam tendo um estímulo imediato para que continuem poupando sua mesada e sonhando com novas metas - que sabem que podem atingir, com muito esforço e dedicação, claro.
Considere algumas lições de matemática
A matemática está em nossas vidas o tempo inteiro, principalmente quando falamos de finanças pessoais.
No dia a dia, ao se ter uma mesada, a criança vai aprendendo na prática como funciona a soma e a subtração. Nas interações com os colegas, por exemplo, pode ser que aprenda a dividir o valor quando tiver que pagar alguma conta em um restaurante com os amigos.
E a própria mesada permite se colocar em situações em que você pode treinar um pouco mais a habilidade de lidar com os números. Uma delas é trabalhar com o percentual. Você pode estimular a criança a guardar pelo menos um percentual de sua mesada para atingir seus objetivos. E como fazer este cálculo? Bom, mostre para ela o motivo de se guardar pelo menos 20% do que ganha, e os benefícios disso. E, uma vez que a criança comece a entender, possa estipular um percentual ainda maior, para que conquiste o que quer ainda mais rapidamente.
Lidar na prática com matemática, além de ajudar na matéria que é base da grade curricular, vai permitir que ela pense mais sobre o dinheiro.
Mostre as vantagens de poupar
Poupar vai muito além de se conseguir o que deseja. Embora as primeiras lições mostrem que o hábito de guardar dinheiro possa garantir benefícios, como a compra do que a criança deseja, você pode se aprofundar no assunto com a criança.
E se, em vez de guardar o dinheiro em um cofrinho ou em um lugar físico, a criança começasse a entender como funciona, na prática, os juros compostos a seu favor? Você não precisa fazer o cálculo de tudo isso ou dar todos os detalhes de como as taxas de juros funcionam. Mas, ao criar uma conta poupança ou mesmo uma conta que tenha rendimentos a partir do CDI, você começa a mostrar para a criança que o hábito de poupar é recompensador.
No início, manter o hábito de guardar em um local com rendimentos fixos cumpre o seu papel de ensinar à criança a importância de poupar. Com o tempo, você pode introduzir assuntos mais complexos, como até mesmo a renda variável. Porém, não precisa acelerar as coisas. O importante é que a criança entenda a importância de poupar, em busca de melhores decisões com o dinheiro que possui.
Saiba impor limites
Para que a criança comece a entender como realmente funciona lidar com o dinheiro, ela tomará algumas decisões. Algumas delas podem ser acertadas, outras não.
O diálogo, neste momento, é extremamente importante. Porém, é preciso que você deixe a criança se frustrar em alguns momentos, ou seja, não pode impedir que ela compre algo que considera superficial com a sua mesada. Esse tipo de frustração fará com que ela entenda que precisamos ponderar muito quando gastamos o nosso dinheiro.
E não caia na tentação de dar mais dinheiro para a criança quando ela tiver gastado tudo. A frustração é parte importante do aprendizado nesta etapa. Porque, uma coisa é ajudar quando a criança consegue se planejar para a compra de um bem maior. Outra é complementar com mais dinheiro quando se percebeu que ela não tomou uma boa decisão.
Por isso mesmo, acompanhar, conversar e deixar com que tenha alguns momentos de frustração é importante para que realmente aprenda sobre o verdadeiro valor do dinheiro.
Ensine a preservar o que tem
Quando falamos em educação financeira, preservar o patrimônio é extremamente importante. Para uma criança, isso significa cuidar bem das coisas que compra, por mais que seja um brinquedo.
A preservação é parte do ensinamento porque, na prática, mostra que a criança realmente se preocupa com o investimento que foi feito. Por isso é importante que ela se esforce para ter o que realmente deseja, mesmo que isso seja uma participação na compra. Ela vai valorizar esse processo cuidando do bem material que adquiriu.
Doar também é importante
Quando ensinamos educação financeira, pode acontecer de estimularmos uma prática muito individualista. Não é bem assim que funciona: a criança precisa perceber que pode contribuir para ajudar outras crianças.
Parte importante do aprendizado é mostrar como nem todos têm as mesmas oportunidades. A quantidade de dinheiro tem um peso maior para algumas pessoas do que para outras, e a criança precisa dosar isso desde cedo. Na convivência social, ela pode acabar tendo uma interpretação equivocada ao lidar com outras crianças que não têm as mesmas condições financeiras que ela.
Por isso, ensinar a doar é importante: quando tiver um brinquedo com o qual não interage mais ou uma roupa que deixou de servir, estimule a criança a doar as peças para outras que realmente precisam.
Cuidado com as crenças limitantes
Como já está bem claro até aqui, guardar dinheiro exige prática e muitas tomadas de decisão. Trata-se mais de uma jornada do que algo que você aprende e internaliza de uma só vez.
Diante disso, a criança pode ficar exposta a algumas crenças limitantes, como alguns ditos de que guardar dinheiro não vale a pena e que o hábito de poupar é característica de ‘pão-duro’.
Sempre reforce para a criança a importância de se persistir nos seus sonhos e no que realmente deseja, para que consiga usar o dinheiro a seu favor.
Você não vai conseguir impedir que a criança esteja bloqueada de pessoas que possuem algumas dessas crenças limitantes. O diálogo e a solidez no ensinamento é crucial, para que elas não se desvirtuem e continuem focadas no objetivo. Por isso mesmo a meta é bem importante nesse sentido, porque dá uma direção para que se mantenham concentradas no que realmente interessa.
Ressalte a importância do trabalho
Por muito tempo, a criança deve ter os pais como referência quando o assunto é lidar com as finanças. Porém, elas precisam aprender que o dinheiro é fruto de trabalho - na verdade, de trabalho duro, que exige comprometimento, dedicação e muito esforço.
Claro que você não deve forçar a criança a trabalhar. Mas, ao passar o ensinamento de como o trabalho é uma etapa essencial para uma boa vida financeira da família, aos poucos ela mesmo constrói essa percepção - tanto que pode até pensar em maneiras de colaborar, em busca de ter uma recompensa no final.
Alguns pais estipulam algumas atividades que as crianças podem cumprir para ter um acréscimo na mesada, como limpar o jardim, ter a cama arrumada, lavar a louça após o almoço, entre outros. Se considerar uma boa ideia, você pode introduzir pequenos estímulos, para que a criança saiba valorizar o dinheiro que ganha por meio do esforço.
Mas, não deixe de conversar e orientar a criança nesses momentos. Embora o esforço seja uma parte importante na construção de seu patrimônio, é preciso dar lições de ética e de respeito mútuo, para que a criança não individualize demais esse processo. Afinal, o trabalho é fruto de uma ação coletiva, e isso precisa ser passado para a criança. Assim, ela vai entender que pode se esforçar, contar com a ajuda de outros e, no fim, conquistar seus objetivos.
Invista na educação financeira
Embora o hábito de poupar possa ser instituído com uma mesada, a educação financeira é uma longa jornada na vida de qualquer pessoa.
Lidar com o dinheiro envolve tomar decisões o tempo inteiro: desde o valor que decidimos comprar algum item importante até a forma de pagamento.
E tudo isso deve ser passado para a criança de forma gradativa. Em um momento em que os brasileiros têm se digitalizado cada vez mais com suas contas bancárias, é preciso vislumbrar a etapa em que a criança comece a utilizar alguns artefatos cruciais no dia a dia, como o cartão de débito ou até mesmo o cartão de crédito.
É comum que, no início, você fique mais próximo da criança e consiga acompanhar todos os seus hábitos de gasto. Mas, com o passar do tempo, a criança se desenvolve, coloca em prática o que aprendeu e começa a buscar outras formas de lidar com o dinheiro.
Respeite o espaço da criança ou adolescente nessa jornada. Porém, em uma coisa você deve investir: na educação financeira da criança.
Isso pode acontecer de diversas formas: vocês podem assistir juntos a canais de vídeo de especialistas sobre o assunto, sempre exemplificando com o que acontece em casa. Pode, também, comprar alguns dos livros mais importantes da área e até mesmo fazer alguns cursos em conjunto.
Com a internet, o acesso à educação financeira se tornou mais fácil e democrático - tanto que você nem precisa gastar dinheiro para que consiga realizar alguns desses cursos.
Só que, tão importante quanto a educação financeira é a prática. Não cobre apenas que a criança traga resultados. É preciso que você também se comprometa a ter o hábito de poupar e até mesmo inclua a criança em algumas decisões importantes que vocês tomaram no âmbito familiar.
Uma boa forma de mostrar isso é compartilhar a planilha de tudo o que entra e o que sai das finanças de toda a família, para que ela entenda como o dinheiro é utilizado.
Com paciência, conversa e, principalmente, muita parceria, a relação entre pais e filhos é essencial para o desenvolvimento da educação financeira. E isso beneficia todas as partes. Para mais dicas de finanças pessoais, assine a newsletter do blog da Embracon.